Resumo:
A partir de uma teorização sobre o acto de comer e a refeição, o estudo analisa a comensalidade real e simbólica nos textos literários bíblicos e apresenta a mesa comum de inspiração bíblica enquanto experiência de gastronomia. Esta mesa pode ser fruída no âmbito do novo turismo, conceito enquadrado num olhar diferenciador, aberto à diversidade, onde cabe também, através de uma gastronomização do sagrado, uma nova forma de olhar a espiritualidade.
O acto de comer em comunidade, intrínseco ao homem, constitui-se como um marcador de identidade cultural, histórica e etnológica, ligando os homens entre si, criando e definindo comunidades, valores, crenças que exprimem um modo de representação e de interpretação do natural e do sobrenatural. Assim, a comunicação, todo o sistema de trocas (dádiva, punição) entre os homens e entre estes e os deuses podem exprimir-se em linguagem de comensalidade bem sucedida ou mal sucedida. O princípio da abundância de bens divinos que caem sobre os homens vê-se concretizado na metáfora de uma refeição abundante e farta, verificando-se o seu inverso quando os deuses negam os seus favores aos homens.
A refeição é um evento real e simbólico com uma função reparadora e restauradora, que alimenta o homem enquanto ser social.
A comensalidade, estudada nos seus diversos níveis (ceia, boda, banquete), pretende situar cada indivíduo num espaço concreto, onde, revelando-se, pode interagir e relacionar-se com as mais diversas finalidades, positivas e negativas. A mesa comum proporciona convivialidade, partilha e o estreitamento de laços, bem como também a afirmação de estatuto e de poder, ocasião em que a mesa se torna lugar de conflito.
O estudo apresenta, por fim, uma proposta de aplicabilidade prática em que a gastronomia bíblica é apontada como um produto turístico singular para os nossos dias. As sugestões transformam a análise teórica sobre a comensalidade em experiências reais de fruição gastronómica, indo buscar ao mundo bíblico a inspiração para a sua instalação. Estas sugestões colocam os pratos que se oferecem não só no caminho das substâncias que alimentam o físico como também no das que alimentam o espírito, atendendo a que se trata de uma experiência, que, embora visando destinatários universais, vai ao encontro do público, cada vez mais abundante, que procura o turismo religioso ou o turismo espiritual e experiências de nicho.