Os escape rooms são uma atividade de turismo experiencial em expansão em Portugal. O desígnio é simples: Cinco pessoas são trancadas numa sala e têm 60 minutos para escapar. Para conseguir, vão ter de seguir várias pistas, aceder a passagens secretas, desvendar enigmas e, acima de tudo, trabalhar em equipa. É uma experiência completamente imersiva, as salas são temáticas e têm uma narrativa específica que cria uma atmosfera que envolve os participantes. Turistas, grupos de amigos, famílias, festas de aniversário, despedidas de solteiro(a) e eventos de team bulding para empresas, os públicos são muito diversificados. São vários os espaços em actividade na zona Centro do país. Por trás de cada escape room há um empreendedor que se apaixonou pela actividade e decidiu arriscar. Destrancaram-nos as suas portas e partilharam connosco as suas motivações, lutas e desígnios por trás de um investimento. Chamam-lhes Game Masters. Estas são as suas histórias.
Unum Secretum
Sala: “O Crime do Padre Amaro”
Website: Unum Secretum
Luís sorriu para o empregado quando este trouxe a conta e viu a toalha de papel toda riscada. O jantar já ia longo e eram muitas as ideias que se debatiam naquela mesa. Nenhuma podia ser desperdiçada.
No dia anterior, Luís Dias (38) e Rodrigo Crespo (35), dois chefes de escuteiros do agrupamento 737 de Marrazes, homens habituados ao ar livre, tinham estado aprisionados numa sala em Lisboa. Conseguiram sair em menos de 60 minutos do escape room e passaram o dobro desse tempo na viagem de regresso a tentar encontra um impedimento para a questão: “porque não fazemos uma coisa destas em Leiria?”. Não encontraram.
“Desde esse dia, jantar após jantar e toalha de mesa após toalha de mesa, tudo surgiu”, revela Luís.
Uma das primeiras decisões foi que o jogo tinha de ter uma ligação forte à cidade. Esgrimiram temas, mas decidiram-se por um, baseado num livro de Eça de Queirós, cujo enredo decorre, precisamente, na zona histórica de Leiria: “O Crime do Padre Amaro”.
O próximo passo era procurar um espaço. Após “largos passeios pela cidade”, encontraram uma casa, na zona velha da cidade. “É antiga e tem vários andares, parece ter saído do Livro do Eça”, revela Luís. Foram precisas algumas intervenções no espaço para criar as condições que ambos pretendiam para o cenário do jogo. “Com recurso à preciosa ajuda do nosso Amigo Carpintas tudo tomou forma”, garante Luís, entre sorrisos. “Obrigado Carpintas!”.
Depois de tudo instalado, chegou o derradeiro desafio. “Saber se o que tínhamos já se podia considerar um jogo/desafio, seria fácil ou difícil, seria possível realizar tudo em 60 minutos?”. Resolveram convidar uma equipa de amigos para fazer o teste. Escaparam, com alguma facilidade. Convidaram uma segunda equipa. Ficaram lá dentro. “Conclusão, cada equipa é uma equipa. Vamos avançar assim!”.
E assim, no inverno de 2015, numa baixa cheia de história e mística, abriram as portas do Unum Secretum. ‘Um segredo’ em Latim, que já foi desvendado por inúmeros visitantes. Alguns entram verdadeiramente no espírito. “Já tivemos malta que encontra a batina do padre Amaro, veste-a e faz o resto do jogo com ela”. Já outros, assumem-se claustrofóbicos e depois, no decurso do jogo, chegam a estar com mais quatro pessoas numa sala com seis metros quadrados, às escuras, sem entrar em pânico, “dado o nível de envolvimento que se tem no jogo”, conclui Luís.
Por vezes, prevalece a competitividade. Grupos de amigos dividem-se e fazem a sala à vez, em busca do melhor tempo. “Os que fazem a sala primeiro deixam mensagens falsas no cenário para a segunda equipa”, refere Luís, entre gargalhadas.
Grupos de amigos são os clientes mais frequentes. Luís salienta ainda a crescente procura do espaço para festas de aniversário, despedidas de solteiro e para atividades de team building por parte das empresas. “Já tivemos situações onde vários departamentos de empresas vieram fazer o jogo e, no final, o diretor de recursos humanos pediu-nos um relatório do desempenho dos participantes”, afirma.
Destaca ainda o turismo internacional. “Existem turistas que, ao chegar ao seu destino, procuram de imediato um escape room para fazer”.
A dupla proprietária do Unum Secretum desempenha esta atividade à margem das suas profissões. Luís é sócio-gerente de uma empresa de automação e Rodrigo é técnico comercial de automação pneumática industrial. Ambos manifestam-se satisfeitos com o retorno do investimento, apesar de ser, presentemente, um hobby. “Temos noção que se fizéssemos uma maior aposta, certamente conseguiríamos um maior retorno”.
O maior incentivo é a “paixão” que nutrem pela atividade. Garantem que o entusiasmo e a motivação continuam elevados: “Quando acabamos um cenário de jogo começamos de imediato a pensar no seguinte. É um processo que nunca pode parar”. Luís salienta que criar cenários e desafios é a sua principal motivação. “Tudo o que seja brincar ao faz de conta, resolver problemas ou enigmas e inventar gadgets é a nossa praia. O escape room foi a forma de aliar tudo isto num local só!”.
Escape Room Leiria
Salas: “O Retiro Misterioso” e “A Cave”
Website: Escape Room Leiria
Cento e setenta! Ao todo, foram 170 dias consecutivos de chuva. Literalmente, a gota de água para uma portuguesa com o ameno clima lusitano no sangue. Paulius Peldzius (35) não teve outra alternativa, senão fazer as malas em Galway e acompanhar a mulher para Portugal. O lituano estava há 15 anos na Irlanda, onde conheceu a esposa, a trabalhar na indústria do software.
Ainda na cidade costeira irlandesa, usou os seus dotes informáticos e de marketing digital para ajudar dois amigos a montar um escape room (Asylroom). Na estreia, trancaram-no lá. Conseguiu sair e adorou a experiência. “Foi fascinante, era uma experiência real, em vez de meramente virtual”. O bichinho atravessou a alfândega e um pouco do Atlântico Norte com ele. E não o abandonou até ao dia em que decidiu abrir o seu próprio escape room na sua nova cidade, Leiria. “Era uma oportunidade de fazer algo diferente, mais criativo. É preciso imensa imaginação para criar jogos imersivos, que sejam interessantes e estimulantes ao mesmo tempo”, afirma.
No início, carregou a cruz que todos carregam: A famigerada busca pelo espaço ideal.
Começou por visitar apartamentos antigos, cuja ligeira degradação se coadunasse com os temas dos seus jogos, mas rapidamente abandonou a ideia devido a obstáculos com a legislação. Optou por uma loja, ampla, que posteriormente particionou de acordo com as passagens secretas, túneis e armadilhas que tinha em mente. “É uma industria muito criativa e a criatividade por vezes surge de improviso”.
Desse processo, nasceram “O Retiro Misterioso” e “A Cave”.
A primeira sala situa-se em 1915, num retiro de um médico que, em vez de curar os seus pacientes, torturava-os com experiências sádicas. A segunda é um antro de um assassino em série que gosta de brincar com as suas vítimas.
“Ambas as salas têm os seus desafios peculiares”, afirma. Uma das suas principais preocupações na concepção da primeira sala foi criar uma história genuína, “com princípio, meio e fim”, algo que Paulius valoriza imenso e “nem sempre encontra”. O outro desafio foi implementar o que denomina de “wow factor”. “Fazes algo e, de repente, algo mágico acontece”, afirma, sorridente.
Esta última característica tornou-se basilar na segunda sala. “É uma sala de puro entretenimento, as pessoas nem imaginam a quantidade de tecnologia que tem por trás”. A sua idealização e materialização fizeram-no ir muito além do que imaginava investir. “Mas valeu a pena, ficou mesmo especial”, refere, com os olhos a brilhar. Faz uma ligeira pausa e complementa: “E ainda tenho mais duas ideias para implementar no futuro. Aí sim, vai ficar mesmo assustador”.
Paulius não faz ideia de quantos escape rooms já visitou. “Deixei de contar há imenso tempo”. Elucida que é um negócio “muito colaborativo” e que as visitas entre concorrentes são normais, frequentes e cooperantes: “discutimos desafios, estratégias, tendências da indústria e claro, fazemos os jogos”.
Considera que o conceito ainda não está muito divulgado na região Centro. “É um desafio corrente”. No entanto, Paulius vislumbra-o como uma oportunidade de negócio. “Muita gente não faz ideia do que se trata. Temos pessoas que aparecem com malas à procura de alojamento ou até casais em busca de uma sex shop”. Em algumas dessas situações, após explicar o conceito, Paulius consegue entusiasmar as pessoas e converter as dúvidas em negócio. “Mas não sem antes me tentarem convencer do quanto o nosso nome induz em erro”, confidencia.
Na sua opinião, as pessoas ainda são um “pouco conservadoras” e hesitantes em dar o passo e experimentar. “Mas quando decidem vir, adoram”, afirma. “Adoram os desafios, o lado social, ter algo diferente para fazer a uma sexta-feira à noite”. Esse é outro fator cultural que Paulius teve de se habituar em terras lusitanas, ou pelo menos na cidade onde opera. “Na Irlanda a malta sai a qualquer dia da semana, é tão normal ir a um escape room depois de jantar a uma quarta-feira como num sábado”. Por cá, as suas reservas continuam a ser predominantes aos fins-de-semana.
A maior parte dos clientes são grupos de amigos, turistas (especialmente franceses e suiços) e aniversariantes: “Temos cada vez mais festas de aniversário, os jovens adoram ser Sherlock Holmes por um dia e desvendar mistérios com os seus colegas”, refere.
O número de empresas a percecionar as vantagens desta atividade também tem aumentado. Recentemente, um empresário trouxe a sua equipa e ficou na sala de controlo a acompanhar o desempenho nos monitores. “No final, ele disse-me que essa era a melhor forma de verificar o quão saudável eram as relações profissionais”, afirma Paulius, complementando logo de seguida: “E tem toda a razão! Nos primeiros 15 minutos vês logo quem é quem”.
São muitos os episódios caricatos no Escape Room Leiria. Paulius sorri sempre que os relembra. A forma sistemática como os adultos complicam o que é simples, os engenheiros que tentam “reinventar a roda”, as pessoas que quase “saltam fora dos sapatos” com os sustos, a tendência masculina de recorrer mais à força do que ao cérebro ou até mesmo a eterna rivalidade entre homens e mulheres.
Paulius desempenha a atividade a full-time e já planeia expandir. Está a pensar numa nova sala e num âmbito mais alargado de atividades. Explica que esta atividade está em constante evolução e os clientes estão sempre à procura de novos desafios. “Já não se trata apenas de encontrar uma chave para escapar”.
No dia anterior, Luís Dias (38) e Rodrigo Crespo (35), dois chefes de escuteiros do agrupamento 737 de Marrazes, homens habituados ao ar livre, tinham estado aprisionados numa sala em Lisboa. Conseguiram sair em menos de 60 minutos do escape room e passaram o dobro desse tempo na viagem de regresso a tentar encontra um impedimento para a questão: “porque não fazemos uma coisa destas em Leiria?”. Não encontraram.
Grupos de amigos são os clientes mais frequentes. Luís salienta ainda a crescente procura do espaço para festas de aniversário, despedidas de solteiro e para atividades de team building por parte das empresas. “Já tivemos situações onde vários departamentos de empresas vieram fazer o jogo e, no final, o diretor de recursos humanos pediu-nos um relatório do desempenho dos participantes”, afirma.
Destaca ainda o turismo internacional. “Existem turistas que, ao chegar ao seu destino, procuram de imediato um escape room para fazer”.
Ainda na cidade costeira irlandesa, usou os seus dotes informáticos e de marketing digital para ajudar dois amigos a montar um escape room (Asylroom). Na estreia, trancaram-no lá. Conseguiu sair e adorou a experiência. “Foi fascinante, era uma experiência real, em vez de meramente virtual”. O bichinho atravessou a alfândega e um pouco do Atlântico Norte com ele. E não o abandonou até ao dia em que decidiu abrir o seu próprio escape room na sua nova cidade, Leiria. “Era uma oportunidade de fazer algo diferente, mais criativo. É preciso imensa imaginação para criar jogos imersivos, que sejam interessantes e estimulantes ao mesmo tempo”, afirma.
No início, carregou a cruz que todos carregam: A famigerada busca pelo espaço ideal.
Começou por visitar apartamentos antigos, cuja ligeira degradação se coadunasse com os temas dos seus jogos, mas rapidamente abandonou a ideia devido a obstáculos com a legislação. Optou por uma loja, ampla, que posteriormente particionou de acordo com as passagens secretas, túneis e armadilhas que tinha em mente. “É uma industria muito criativa e a criatividade por vezes surge de improviso”.
A primeira sala situa-se em 1915, num retiro de um médico que, em vez de curar os seus pacientes, torturava-os com experiências sádicas. A segunda é um antro de um assassino em série que gosta de brincar com as suas vítimas.
“Ambas as salas têm os seus desafios peculiares”, afirma. Uma das suas principais preocupações na concepção da primeira sala foi criar uma história genuína, “com princípio, meio e fim”, algo que Paulius valoriza imenso e “nem sempre encontra”. O outro desafio foi implementar o que denomina de “wow factor”. “Fazes algo e, de repente, algo mágico acontece”, afirma, sorridente.
Paulius não faz ideia de quantos escape rooms já visitou. “Deixei de contar há imenso tempo”. Elucida que é um negócio “muito colaborativo” e que as visitas entre concorrentes são normais, frequentes e cooperantes: “discutimos desafios, estratégias, tendências da indústria e claro, fazemos os jogos”.
Na sua opinião, as pessoas ainda são um “pouco conservadoras” e hesitantes em dar o passo e experimentar. “Mas quando decidem vir, adoram”, afirma. “Adoram os desafios, o lado social, ter algo diferente para fazer a uma sexta-feira à noite”. Esse é outro fator cultural que Paulius teve de se habituar em terras lusitanas, ou pelo menos na cidade onde opera. “Na Irlanda a malta sai a qualquer dia da semana, é tão normal ir a um escape room depois de jantar a uma quarta-feira como num sábado”. Por cá, as suas reservas continuam a ser predominantes aos fins-de-semana.
A maior parte dos clientes são grupos de amigos, turistas (especialmente franceses e suiços) e aniversariantes: “Temos cada vez mais festas de aniversário, os jovens adoram ser Sherlock Holmes por um dia e desvendar mistérios com os seus colegas”, refere.
O número de empresas a percecionar as vantagens desta atividade também tem aumentado. Recentemente, um empresário trouxe a sua equipa e ficou na sala de controlo a acompanhar o desempenho nos monitores. “No final, ele disse-me que essa era a melhor forma de verificar o quão saudável eram as relações profissionais”, afirma Paulius, complementando logo de seguida: “E tem toda a razão! Nos primeiros 15 minutos vês logo quem é quem”.